05 abril 2023

ATIVIDADE - REALISMO - 2 ANO

 Leitura

                       

                                                O primo Basílio (Eça de Queirós)
Fragmento 1
            Havia doze dias que Jorge tinha partido e, apesar do calor e da poeira, Luísa vestia-se para ir a casa de Leopoldina. Se Jorge soubesse não havia de gostar não. Mas estava tão farta de estar só! Aborrecia-se tanto! De manhã ainda tinha os arranjos a costura, a toalete, algum romance... Mas de tarde!
            A hora em que Jorge costumava voltar do ministério, a solidão parecia alargar-se em torno dela. Fazia-lhe tanta falta o seu toque de campainha, os seus passos no corredor!...
            Ao crepúsculo, ao ver cair o dia, entristecia-se sem razão, caía numa vaga sentimentalidade; sentava-se ao piano, e os fados tristes, as cavatinas apaixonadas gemiam instintivamente no teclado, sob os seus dedos preguiçosos, no movimento abandonado dos seus braços moles. O que pensava em tolices então! E à noite, só, na larga cama francesa, sem poder dormir com o calor, vinham-lhe de repente terrores, palpites de viuvez.

Fragmento 2
            Servia, havia vinte anos. Como ela dizia, mudava de amos, mas não mudava de sorte. Vinte anos a dormir em cacifos, a levantar-se de madrugada, a comer os restos, a vestir trapos velhos, a sofrer os repelões das crianças e as más palavras das senhoras, a fazer despejos, a ir para o hospital quando vinha a doença, a esfalfar-se quando voltava a saúde!... Era demais! Tinha agora dias em que só de ver o balde das águas sujas e o ferro de engomar se lhe embrulhava o estômago. Nunca se acostumara a servir [...].
            As antipatias que a cercavam faziam-na assanhada, como um círculo de espingardas enraivece um lobo. Fez-se má; beliscava crianças até lhes enodoar a pele; e se lhe ralhavam, a sua cólera rompia em rajadas. Começou a ser despedida. Num só ano esteve em três casas. Saía com escândalo, aos gritos, atirando as portas, deixando as amas todas pálidas, todas nervosas... [...]
            A necessidade de se constranger trouxe-lhe o hábito de odiar; odiou sobretudo as patroas, com um ódio irracional e pueril.
                    O primo Basílio. In Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguiar, 1986. P. 585 e 597. V. 1.
                                                         RELEITURA

1.      Considere o seguinte fragmento de uma das famosas Conferências do Cassino Lisbonense, em que Eça de Queirós teoriza sobre o novo estilo, comparando-o com o Romantismo:
[...] o Realismo é uma reação contra o Romantismo: o Romantismo era a apoteose do sentimento; - o Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos – para condenar o que houver de mau na nossa sociedade.
                                    António José Saraiva e Óscar Lopes. História da literatura portuguesa.
                                                                                             Porto: Porto Editora, 1975. p. 960.       

a)      O narrador caracteriza Luíza como uma personagem romântica. Que traços da personagem, presentes no fragmento 1, nos permitem associá-la com o Romantismo?


b)      Luísa é caracterizada por meio de uma ótica realista, na medida em que o narrador critica-lhe o romantismo, em vez de aderir a ele. Que frase do fragmento 1 comprova essa afirmação?

2.       Além da postura racional e objetiva, necessária para a “ anatomia do caráter `` pretendida pelos escritores realistas, esse estilo, em sua vertente naturalista, vê o comportamento humano como consequência de certos fatores que o determinam.

a)      No caso de Luísa, que no romance é casada com Jorge e tem uma vida ociosa, de classe média abastada, a que fatores presentes no texto podemos atribuir os seus traços românticos?

b)      E no caso de Juliana, a segunda personagem caracterizada no fragmento 2? Qual é o fator determinante de sua revolta, de seu ódio?


3.      Ao ver o homem como produto de leis biológicas, o estilo naturalista o compara com os outros animais.
a)      Transcreva o trecho do fragmento 2 que exemplifica essa característica.


b)      Em que sentido o fragmento 2 ilustra o tema das desigualdades sociais intensamente tratado pelos escritores realistas?

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