TEXTO 01
Versos íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
1. O soneto foi construído como se o eu poético fosse um
falante se dirigindo a um interlocutor.
a) Há uma única
palavra que nos passa mínima informação sobre a identidade do interlocutor.
Qual é essa palavra? Que função sintática desempenha no texto?
b) Como você caracteriza o falante em relação ao
interlocutor? Justifique sua resposta apontando os elementos gramaticais de que
se vale o falante nos enunciados.
2. Qual a postura do
eu poético em relação à vida/ Explique.
TEXTO 02
O morcego
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
"Vou mandar levantar outra parede ..."
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh'alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
3. A que o morcego é comparado neste poema? Explique.
4. Como no poema
anterior, é possível afirmar que esse texto é dirigido a uma 2ª pessoa?
Transcreva um verso que comprove sua resposta.
5. O texto está todo
centrado na utilização de uma figura de linguagem. Que figura é essa?
6. Para o poeta há alguma possibilidade de o homem fugir de
sua própria consciência? Justifique com um trecho do poema.
TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA
Primeira Parte
A Lição de Violão
Como de hábito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma, bateu em
casa às quatro e quinze da tarde. Havia mais de vinte anos que isso acontecia.
Saindo do Arsenal de Guerra, onde era subsecretário, bongava pelas confeitarias
algumas frutas, comprava um queijo, às vezes, e sempre o pão da padaria
francesa. Não gastava nesses passos nem mesmo uma hora, de forma que, às três e
quarenta, por aí assim, tomava o bonde, sem erro de um minuto, ia pisar a
soleira da porta de sua casa, numa rua afastada de São Januário, bem exatamente
às quatro e quinze, como se fosse a aparição de um astro, um eclipse, enfim um
fenômeno matematicamente determinado, previsto e predito. A vizinhança já lhe
conhecia os hábitos e tanto que, na casa do Capitão Cláudio, onde era costume
jantar-se aí pelas quatro e meia, logo que o viam passar, a dona gritava à
criada: “Alice, olha que são horas; o Major Quaresma já passou”. E era assim
todos os dias, há quase trinta anos. Vivendo em casa própria e tendo outros
rendimentos além do seu ordenado, o Major Quaresma podia levar um trem de vida
superior aos seus recursos burocráticos, gozando, por parte da vizinhança, da
consideração e respeito de homem abastado. Não recebia ninguém, vivia num
isolamento monacal, embora fosse cortês com os vizinhos que o julgavam
esquisito e misantropo. Se não tinha amigos na redondeza, não tinha inimigos, e
a única desafeição que merecera fora a do Doutor Segadas, um clínico afamado no
lugar, que não podia admitir que Quaresma tivesse livros: “Se não era formado,
para quê? Pedantismo!” O subsecretário não mostrava os livros a ninguém, mas
acontecia que, quando se abriam as janelas da sala de sua livraria, da rua
poder-se-iam ver as estantes pejadas de cima a baixo. Eram esses os seus
hábitos; ultimamente, porém, mudara um pouco; e isso provocava comentários no
bairro. [...] Uma tarde de sol – sol de março, forte e implacável – aí pelas
cercanias das quatro horas, as janelas de uma erma rua de São Januário
povoaram-se rápida e repentinamente, de um e de outro lado. Até da casa do
general vieram moças à janela! Que era? Um batalhão? Um incêndio? Nada disto: o
Major Quaresma, de cabeça baixa, com pequenos passos de boi de carro, subia a
rua, tendo debaixo do braço um violão impudico. É verdade que a guitarra vinha
decentemente embrulhada em papel, mas o vestuário não lhe escondia inteiramente
as formas. À vista de tão escandaloso fato, a consideração e o respeito que o
Major Policarpo Quaresma merecia nos arredores de sua casa diminuíam um pouco.
Estava perdido, maluco, diziam. Ele, porém, continuou serenamente nos seus
estudos, mesmo porque não percebeu essa diminuição. Quaresma era um homem
pequeno, magro, que usava pince-nez, olhava sempre baixo, mas, quando fixava
alguém ou alguma cousa, os seus olhos tomavam, por detrás das lentes, um forte
brilho de penetração, e era como se ele quisesse ir à alma da pessoa ou da
cousa que fixava. Contudo, sempre os trazia baixos, como se se guiasse pela
ponta do cavanhaque que lhe enfeitava o queixo. Vestia-se sempre de fraque,
preto, azul, ou de cinza, de pano listrado, mas sempre de fraque, e era raro
que não se cobrisse com uma cartola de abas curtas e muito alta, feita segundo
um figurino antigo de que ele sabia com precisão a época. Quando entrou em
casa, naquele dia, foi a irmã quem lhe abriu a porta, perguntando: – Janta já?
– Ainda não. Espere um pouco o Ricardo que vem jantar hoje conosco. –
Policarpo, você precisa tomar juízo. Um homem de idade, com posição,
respeitável, como você é, andar metido com esse seresteiro, um quase capadócio
– não é bonito! 8 O major descansou o chapéu-de-sol – um antigo chapéu-de-sol
com a haste inteiramente de madeira, e um cabo de volta, incrustado de pequenos
losangos de madrepérola – e respondeu: – Mas você está muito enganada, mana. É
preconceito supor-se que todo o homem que toca violão é um desclassificado. A
modinha é a mais genuína expressão da poesia nacional e o violão é o
instrumento que ela pede. Nós é que temos abandonado o gênero, mas ele já
esteve em honra, em Lisboa, no século passado, com o Padre Caldas que teve um
auditório de fidalgas. Beckford, um inglês, muito o elogia. – Mas isso foi em
outro tempo; agora... – Que tem isso, Adelaide? Convém que nós não deixemos
morrer as nossas tradições, os usos genuinamente nacionais... [...] Policarpo
era patriota. Desde moço, aí pelos vinte anos, o amor da pátria tomou-o todo
inteiro. Não fora o amor comum, palrador e vazio; fora um sentimento sério, grave
e absorvente. Nada de ambições políticas ou administrativas; o que Quaresma
pensou, ou melhor: o que o patriotismo o fez pensar foi num conhecimento
inteiro do Brasil, levando-o a meditações sobre os seus recursos, para depois
então apontar os remédios, as medidas progressivas, com pleno conhecimento de
causa.
(Fragmento) BARRETO,
Lima. O triste fim de Policarpo Quaresma. 20ª edição. Rio de Janeiro: Ediouro,
1996, p.11-13. 11.
7.Volte ao fragmento de “Triste fim de Policarpo Quaresma” e
divida o texto em 4 partes, marcando seus limites a partir da seguinte
sugestão:
a. Parte 1: a
descrição da rotina/hábitos do Major Quaresma (apresentação).
b. Parte 2: a mudança de hábito do Major Quaresma
(“conflito” do fragmento – quebra da rotina).
c. Parte 3: as características
físicas do personagem Major Quaresma (perfil físico do personagem).
d. Parte 4: as características da personalidade do Major
Quaresma (perfil psicológico do personagem).
8. Leia agora a letra do samba enredo do GRES Unidos da
Tijuca, de 1982, quando a terceira escola de samba mais antiga do país, situada
no morro do Borel, homenageou o escritor Lima Barreto
Lima Barreto - Mulato, Pobre, Mas Livre
Adriano
Vamos recordar Lima Barreto
Mulato pobre, jornalista e escritor
Figura destacada do romance social
Que hoje laureamos neste carnaval
O mestiço que nasceu nesta cidade
Traz tanta saudade em nossos corações
Seus pensamentos, seus livros
Suas ideias liberais
Impressionante brado de amor pelos humildes
Lutou contra a pobreza e a discriminação
Admirável criador, ô ô ô ô
De personagens imortais
Mesmo sendo excelente escritor
Inocente, Barreto não sabia
Que o talento banhado pela cor
Não pisava o chão da Academia
Vencido pela dor de uma tragédia
Que cobria de tristeza a sua vida
Entregou-se à bebida
Aumentando o seu sofrer
Sem amor, sem carinho
Esquecido morreu na solidão (bis)
Lima Barreto
Este seu povo quer falar só de você (bis)
A sua vida, sua obra é o nosso enredo
E agora canta em louvor e gratidão
a. Observe os seguintes versos: “Mesmo sendo excelente
escritor / Inocente, Barreto não sabia? Que o talento banhado pela cor / Não
pisava o chão da Academia”
b.A que Academia se refere o texto?
c.O que esses versos sugerem quanto à seleção dos escritores
para a Academia?
d. “Seus pensamentos,
seus livros / Suas ideias liberais / Impressionante brado de amor pelos
humildes”. O que esses versos revelam em relação à obra deste renomado
escritor.
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